quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

O Tacão de Ferro

O Tacão de Ferro, de Jack London, é um livro que impressiona. Muito bom realmente. Trata-se de um romance, uma espécie de ficção sociológica em que o autor se vale do gênero literário para expor conceitos do marxismo e defender a tese de que nenhuma ilusão pacifista ou reformista seria capaz de impedir que o capitalismo enveredasse por regimes de violência em seus períodos de crise. E Jack London faz isso com maestria, prognosticando o socialismo reformista do início do século XX como falsa alternativa aos trabalhadores e prevendo o surgimento do fascismo como módulo político funcional às elites.
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O Tacão de Ferro é uma expressão criada pelo autor para designar esse endurecimento do regime político. Trata-se da história de Ernest Everhard (o nome não é a toa), operário intelectual, líder do partido socialista, e posteriormente eleito deputado, que faz amizade com um professor universitário progressista e acaba por se envolver com sua filha, que por sua vez adere aos ideais de seu amado e escreve o livro como modo de reconhecer e engrandecer o trabalho de Everhard. É um livro escrito na primeira pessoa, com notas de rodapé de um editor do futuro, que escreve setecentos anos depois dos acontecimentos relatados no manuscrito. É um livro instigante, violento sobretudo da metade até o final, assumindo ares de distopia, mas que antecipa e prevê muito do que realmente aconteceria no trágico século XX.
O Tacão de Ferro foi publicado em 1907, tido à época como pessimista, acabou por se revelar uma profecia acertada do que viria a ser o sistema capitalista das décadas posteriores. O livro tem erros; na edição da Boitempo, com tradução de Afonso Teixeira Filho, há um posfácio de Trotsky no qual o mesmo reconhece haver erros, mas é de fato um clássico da literatura e merece ser propagado, tanto por sua riqueza estilística quanto pela tese extremamente atual da agonia do capitalismo como modo de produção caduco e fadado à barbárie.
O livro é extremamente atual porque aponta para o regime de barbárie social e violência política do imperialismo e porque coloca a questão da burocracia sindical como elemento importante do status quo; uma casta à parte é formada, dando origem a uma aristocracia operária, traidora, odiada pelos trabalhadores. O que tem tudo a ver com o peleguismo chapa branca do qual temos insistentemente falado como sendo um dos elos podres do regime político a ser ultrapassado pelo conjunto dos trabalhadores.
Outra característica interessante da obra é a hipérbole como elemento de narrativa, o que fez London chegar ao extremo de descrever essa aristocracia operária como elemento completamente apartado da massa de trabalhadores, vivendo em bairros separados, com escolas específicas para seus filhos, etc. De igual modo London hiperboliza o quadro social do lumpem-proletariado, chamado no livro de "povo do abismo", uma massa de miseráveis, extremamente violenta e ignorante, também apartada do convívio comum e que tinha sua funcionalidade social: barbarizar e servir de massa de manobra aos interesses do Tacão de Ferro.

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quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

O jovem Marx

Sobre o filme

Jovem Marx é também a história do jovem Engels; e a história de uma das parcerias mais significativas que a História já viu. Não dá pra considerar a obra de Marx sem levar em conta a contribuição de Engels. Não só pela amizade e contribuição material do burguês-industrial Engels ao amigo, o que liberou Marx para se dedicar à redação de sua obra, mas pela própria contribuição teórica.

O filme mostra isso na cena em que Engels recomenda a Marx a leitura e a análise dos economistas ingleses, logo após declarar que Marx era um gênio e em contrapartida ouvir do amigo que seu livro "A situação da classe trabalhadora na Inglaterra" era um excelente trabalho.

O filme cai em alguns clichês, típicos do gênero cinematográfico, como no enfoque às vidas amorosas de seus protagonistas, ou como nas cenas em que o espirituoso Marx se envolve em confusões que são transmitidas como burlescas ou cômicas. Isso é de costume nos filmes; mas o diretor foi competente na gravação e o roteiro traça bem o perfil sócio-histórico da época, bem como as influências políticas e filosóficas que fizeram com que Marx e Engels trilhassem o caminho do materialismo-dialético, juntando-se à vanguarda do movimento operário europeu e se dedicando à elaboração científica, a sistematização teórica da doutrina comunista; superando concepções idealistas comuns ao jovem movimento dos trabalhadores, à época muito influenciado pelo socialismo utópico e pela direção anarquista.

O filme retrata bem o aguçadíssimo espírito crítico de Marx, e sua capacidade de esmiuçar dialeticamente os dados a sua disposição. Marx foi um gigante, é um gigante. Sua contribuição só vê a sombra de um outro grande gênio e revolucionário: Vladmir Ilich Lenin. Fica a dica para um filme desse outro grande mestre do proletariado. Um dia desses surgiu um papo de que o DiCaprio interpretaria o velho bolchevique.

Outra coisa que merece nota é a cena final, dos créditos, com uma inusitada trilha sonora de Bob Dylan e uma sequência de imagens da história do século XX até a atualidade, com colapsos econômicos, guerras, revoluções, contra-revoluções, manifestações, eleições.
O que Marx previu, as instabilidades advindas das contradições inerentes ao movimento do capital, continuam dando o tom do curso histórico, e só serão superadas pelo comunismo. Como o filme faz questão de mostrar Marx falando: nada é definitivo nesse mundo, tudo está em constante movimento, do escravismo ao feudalismo, do feudalismo ao capitalismo, e este não é o fim da história, mas uma etapa que já começa a ser superada porque não é capaz de solucionar os impasses que ele mesmo criou. Leiam O Capital. Marx continua a ser a chave para entender nossa sociedade e pensar uma alternativa à barbárie.

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