terça-feira, 4 de abril de 2023

Com Yeshuah na jornada do silêncio

Poema místico



Yeshuah, mestre e Deus

Visitaria nossa cidade

E nós o esperávamos! 


Corações ansiosos na fria noite da vigília

Cabeças pendentes de sono

Nossos ossos doloridos

Nossos lábios ressecados.

Yeshuah chegou no limiar da aurora 

Rosto cortado pelo vento

Roupas em desalinho, ofegante respiração de caminhante.


Quisemos lavar seus pés 

Oferecemos água de nossos cantis

Queríamos a intimidade do mestre

Falar como próximos que partilham a camaradagem de uma jornada

Mas Yeshuah queria nos mostrar a virtude do silêncio. 

Falava aos nossos corações com seu olhar.


Quisemos que bebesse do leite fresco que providenciáramos, tínhamos mel e queijos, pães e frutas secas.

Mas o mestre nos presenteou com o jejum.

Haveria o tempo de comer

Primeiro queria caminhar conosco entre os raios multicores que atravessavam a manhã da nossa cidade. 

As ruas vazias...


Levamos Yeshuah ao nosso melhor jardim

Sentamos silentes aos seus pés. 

A manhã ainda fria, nossos corpos enregelados

O ar puro penetrando os pulmões em compassada respiração 

Os raios do sol incipientes.


Yeshuah nos fitou nos olhos

E um raio de sol atingiu-lhe as pupilas...

Belíssimas!

Nos revelavam a beleza da eternidade 

A ternura do absoluto 

A memória de quando ainda não existíamos

A paz de quando sequer tínhamos pensamentos. 


Mas era preciso levantar do nosso furtivo êxtase.

O mestre quis sair da cidade 

Pra nos levar ao cume de uma montanha.

Tínhamos que empreender marcha.


Um dia de caminhada e chegamos ao sopé de uma montanha.

Montamos acampamento 

Tratamos de fazer fogo

O céu era especialmente bonito

E a noite se anunciava fria.

Em torno do fogo o senhor da vida quis partir o pão

E o pão tinha sabor de algo absolutamente antigo e novo

De um revigoramento sublime 

Que recuperava o corpo e dava ao coração alegria singular e inaudita


Quiserámos de novo resistir em voltar à realidade. 

Yeshuah continuava a nos falar ao coração 

E nos surpreendeu com a ordem de levantar acampamento. 

Iria nos guiar montanha acima

Enquanto nos falava das coisas da vida e da morte 


Caminhávamos pressurosos

E então o mestre nos advertiu a ter calma e a saborear também o caminho, passo a passo

E suas palavras pareciam mesmo dar o ritmo para uma suave andança. 


Nos falou da cruz

Das horas da cruz

E lágrimas nos corriam abundantes pelas faces

Tão duras eram as desventuras que o mestre nos narrava

E como por um passe de mágica começamos a notar as semelhanças de nossas dores com as terríveis dores de sua cruz.

Ouvíamos o agoniado gotejar do sangue

Nossas gargantas secavam como se fosse meio dia com sol forte

E a fadiga nos molestava em sucessivas tentações e soluços. 


Era um trecho escarpado da subida

E sucumbir seria fácil não fosse a valorosíssima companhia do mestre.

Chegamos ao alto da montanha 

Yeshuah então nos permitiu tragar uma água de perdão. 


No céu escuro um corvo negro cruzou a noite 

E Yeshuah nos falava dos florescentes sonhos dos místicos de todos os tempos

Dos risonhos tremeliques do menino-Deus na manjedoura

Dos contemplativos nos desertos dos séculos 

De como se aproximaram do trono da manjedoura

E tocaram com suas mãos os pezinhos e as mãozinhas do recém-nascido de Belém. 

Ficamos absortos e como que caíamos por terra ante suas preciosas e doces palavras.

Yeshuah não nos deixou quedar pelo terreno 

Iria nos levar adiante

Foi quando percebemos que muito mais havíamos de subir

Que estávamos apenas num primeiro patamar de montanha 


Ouvíamos a voz do silêncio 

A noite ia se fazendo mais clara

E anjos acampavam ao redor

Cantando afetuosa e delicadamente as verdades do universo

De como Yeshuah é rei do universo 

E de como o cosmos é só um dossel de uma parte da glória de seu Pai

Que outros mundos celebram a magnitude, a bondade e a clemência de Deus

Que os olhos não podem ver sequer uma simples medida daquilo que é estabelecido nas alturas da imortalidade.

E que toda sorte de beleza emana do sopro terrível de Deus

Que é ao mesmo tempo tão espantosamente potente e mais doce que qualquer doçura que podemos conhecer na vida


Outros patamares de montanha galgamos em poucos e imperceptíveis passos de pessoa.

Já não trilhávamos por razão humana. 

As verdades que nos revelava o mestre nos faziam passar por sobre o tempo

E em convulsivas descargas de êxtase nos encaminhávamos ao cume


Os sentidos nos faltando... 

Apenas borbotões de estremecimentos nas visões maravilhosamente perfeitas

Cores e quadros inexplicáveis 

Histórias que nunca nos contaram

Os mortos que voltaram à vida

Os profetas e as virgens, os alucinados, os mártires e os arrependidos

O céu tomado de assalto na bruma exuberante da criação... 


E então a paz.

A paz perfeita. 

O silêncio novamente.