domingo, 17 de setembro de 2017

O menino dos sinônimos


Observava o fluxo da rua, dos transeuntes distraídos, dos motoristas que guiavam automaticamente, como se não houvesse mundo fora dos limites do asfalto. Imaginou que deveria meditar mais, meneou a cabeça, reconsiderou o pensamento, fitou o céu da cidade ensolarada. Por fim cruzou olhar com ela, figurinha simpática. Era bonita, de uma beleza singela, tocante. O tipo de pessoa que desperta instantâneo afeto, de membros diminutos, semblante sereno e peito aberto no meio de um suspiro. Notou que tinha olhinhos claros, pele de adolescente na puberdade, com cravos e espinhas que não lhe roubavam a beleza e que ao mesmo tempo lhe atribuíam traços de ninfa. Resolveu se aproximar depois de alguns instantes de insegurança paralisante.
-Oi. Eu notei/ reparei/ observei/ constatei/ vi que você tá sozinha/ isolada. Pensei/ ponderei/ imaginei se podia de alguma maneira/ modo/ forma te distrair/ entreter.
A moça não conseguiu disfarçar o espanto, arregalou os olhos, esboçou um sorriso e amistosa estendeu a mão.
-Cara, você é muito louco! Prazer, Clara. Clarinha pros chegados.      
-Prazer/ satisfação/ encantado. Ops, encantado é um termo/ designação/ palavra meio/ relativamente antigo/ ultrapassado/ velho mesmo.                      
Ele gesticulava um pouco estabanado, as pernas fixas numa mesma posição revelavam tensão diante da circunstância. A moça se impacientou.
-Como é o seu nome?                       
-Júnior - respondeu num sobressalto.  
-Senta aí - disse a garota abrindo espaço no banco do jardim. - Tô um pouco entediada, tentando parar de fumar. Me fala de você. Você parece gostar de falar.
Ele riu. Baixou rapidamente a cabeça e esfregou uma mão na outra enquanto tomava assento ao lado da pretendente. E desatou a falar.          
-Ah, eu gosto/ aprecio/ estimo de conversar/ dialogar, às vezes falo/ expresso/ verbalizo muito/ demasiado/ exageradamente. É o que diz/ fala o pessoal. Mas/ no entanto/ entretanto/ todavia eu sigo/ continuo interagindo/ me relacionando com as pessoas.    Pigarreou, emendou uma conclusão.       
-E você?                    
-Eu o que? - devolveu a moça em um sorriso aberto.                      
-Me conta/ narra/ explana sobre/ acerca de você.                
-Não tô bem pra falar hoje, anjo.   -Eu notei/ reparei/ observei/ constatei que você é muito/ bastante/ consideravelmente bonita/ interessante/ charmosa/ atraente. Eu quereria/ desejaria/ gostaria...
E num breve lapso, em um segundo que o garoto titubeou pra lançar o sinônimo subsequente, a menina se levantou.
-Desculpa, querido. Eu tenho namorado lá fora. Vou ver uma coisa na biblioteca. Virou as costas e foi andando.                  
-Elias Macedo Júnior - disse uma voz forte que se aproximava.        
-Eu - respondeu.            
-Toma aqui seu comprimido - disse o enfermeiro oferecendo água num copinho de plástico descartável. -Vê se não incomoda a paciente nova, falou?!

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