Resenha feita para o site do jornal Gazeta Revolucionária
Cidadão Boilesen é um documentário muito bem feito. Muito mesmo. Lançado em 2009, é certamente um dos melhores documentários brasileiros. Dinâmico, envolvente, com um timing muito feliz, a produção de Chaim Litewski conta a história de Hening Boilesen, dinamarquês radicado no Brasil, executivo, presidente do grupo empresarial Ultra, da Ultragaz.
Boilesen era um dos figurões responsáveis pela Operação Bandeirantes ( Oban ), órgão surgido dos esquadrões da morte, grupos de militares que executavam marginais. A Oban era um grupo de empresários que se cotizavam para financiar a repressão aos movimentos políticos contrários à ditadura. Se ligaram aos militares e formaram um grupo integrado por policiais militares e civis, de forma clandestina, para defender os interesses das empresas.
Boilesen tinha destaque nesse grupo de empresários. Era um anti-comunista ferrenho. Além de angariar fundos com os ricaços, fazia questão de assistir às sessões de tortura e de participar inclusive. Trouxe dos Estados Unidos uma máquina de eletrochoques para que fosse usada nas torturas, que ficou conhecida como pianola de Boilesen. A máquina tinha um teclado em que havia várias gradações de descarga elétrica.
Reconhecido por guerrilheiros, foi sentenciado à morte. No dia 15 de Abril de 1971, na Alameda Casa Branca, em São Paulo, sofreu emboscada de guerrilheiros do Movimento Revolucionário Tiradentes ( MRT ) e da Aliança Libertadora Nacional ( ALN ) e foi executado a tiros. Sobre seu corpo foram deixados panfletos que diziam o motivo do justiçamento.
O filme de Litewski teve o mérito de reconstruir em detalhes a história de Boilesen, desde o nascimento e a infância na Dinamarca, as controversas características da personalidade, boletins de colégio, a adolescência, o gosto por esportes ( foi boxeador na juventude ) etc, até a chegada ao Brasil, sua simpatia pelo país, seu jeito extrovertido, afeito à festas, sua facilidade de exercer liderança e a meteórica ascensão na carreira de executivo.
Outro mérito do filme de Litewski é dar voz a todos os lados. O filme não necessita ser um samba de uma nota só. O espectador é livre para chegar a uma conclusão. O diretor, além de recorrer a jornalistas e historiadores, entrevista atores dos dois lados no conflito: militares e guerrilheiros, e inclusive o próprio filho de Boilesen. No filme, por exemplo, é relevante a participação de Ulstra, coronel, chefe do DOI - CODI à época, e do ex presidente Fernando Henrique Cardoso.
Nada disso, no entanto, é capaz e ocultar o que fica evidente ao longo do documentário: Boilesen foi um psicopata, que tinha prazer sádico em presenciar torturas. Um direitista convicto. Boilesen representa bem a classe sócio-política a qual pertencia, sua ideologia e visão de mundo. Por isso se tornar objeto do documentário. Outros elementos tiveram naquela organização política o mesmo peso e importância de Boilesen.
Não é de bom tom, claro, comemorar a morte de ninguém, mas cumpre dizer que Boilesen não fez falta alguma. Era o tipo de homem que se comprazia com a crueldade da tortura e com o servilismo aos donos da situação. Agora, há quase 50 anos do ocorrido, a poucos dias de completar mais um aniversário do golpe de 64, trazemos aos leitores a memória e a sugestão desse bom filme, dessa discussão que permanece atual. Para que não se repita, para que nunca mais aconteça.
Ditadura militar nunca mais! Viva os guerreiros brasileiros que tombaram na luta contra a ditadura!
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