terça-feira, 22 de outubro de 2019
Coringa / Clownesco impactante!
Alerta de spoiler *
Fui ver o Coringa. Muito bom. Gostei bastante. O filme de Todd Philips foi muito feliz em captar o espírito do nosso tempo. Retrata com excelência a atual conjuntura social e política, a cultura das grandes cidades, sua realidade neurótica, caótica e desumana.
Quem foi ao cinema desavisado, esperando ver um inocente filme sobre vilões de quadrinhos, deve ter saído perturbado. Eu, que fui ciente de que o filme seria carregado de drama e crises existenciais, saí de lá de certa forma surpreso pelo peso psicológico da obra. Não é um filme comum. Foge definitivamente às características do padrão blockbuster e adere ao hiper realismo.
Quem é Coringa?
O personagem Coringa é um palhaço ruim, que não tem graça, sujeito desdentado e fudido, com sérios problemas mentais, com um problema de riso compulsivo que sempre o coloca em situações embaraçosas; um sujeito que se vê desassistido pelo serviço público de saúde, que nega seu tratamento alegando cortes no orçamento.
Perde o emprego após sofrer uma horrorosa surra de meninos de rua. Em seguida descobre ser filho adotado e que sua mãe é louca; além de ser humilhado publicamente pelo humorista que mais admira. Uma desgraça completa a vida do personagem. Decide então ir à forra. Munido de um tresoitão adota um perfil extremamente violento e vingativo.
O retrato do nosso mundo
O contexto social de Gothan City é uma imagem praticamente fiel da última década, um sombrio retrato da crise neoliberal que engendra violência e caos social, crises subjetivas e descontentamento em massa.
O filme sugere ondas de rebelião popular que podemos muito bem comparar ao que se vê agora no Equador e no Chile, por exemplo, de massivas manifestações contra o sistema, de revolta contra os ricos e de resistência popular perante a barbárie cotidiana.
Coringa, apesar de despolitizado e alheio às mobilizações sociais que o cercam, serve de estopim para a fúria da massa, que se rebela e cobra sangue.
A massa sempre quer sangue. Na sala de cinema o público se regozija com a colérica e selvagem rebeldia. É o momento da catarse, de simbologia da revanche popular, do desagravo da plebe enfurecida.
Semana retrasada eu falava aqui sobre Bacurau, o nosso Tarantino do sertão, história de resistência e de muito sangue. Curiosamente tem sido, junto a Coringa, o filme mais comentado recentemente. Parece que a tendência é mesmo essa. As ruas da América Latina dão o tom da revolta e do espírito de enfrentamento.
Outra coisa que me chamou atenção no filme foi o caráter clownesco. Foi na verdade uma grata surpresa. Não havia visto nenhum comentário nesse sentido. O clown de Todd Philips, interpretado magnificamente por Joaquin Phoenix, dá um toque de sutileza e de poesia ao enredo. O personagem Coringa traz traços bem definidos de arte clown, mais especificamente de clown Augusto, vagabundo, marginal. É o elemento anti social, desviante, bizarro, que não se adequa socialmente, elemento subversivo, anárquico, dionisíaco, disruptivo.
Esse filme é revolucionário, de forte crítica social. Vale a pena conferir.
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Muito bom!
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