sábado, 3 de janeiro de 2015

Alienação do trabalho em Lukács e Holloway

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                                                                          publicado originalmente no site da RPR


No capitalismo, a força de trabalho do proletário é uma mercadoria que este vende ao patrão em troca de um salário, geralmente uma quantia paga em dinheiro mensalmente. A partir de então o trabalho do proletariado passa a ser de propriedade do capitalista, que se utiliza do trabalho de seu assalariado como bem entende. 

Nesse processo de venda da força de trabalho, única saída que o operário tem para sobreviver na ausência de posse dos meios de produção, sua forca de trabalho é submetida ao trabalho abstrato, inserido no contexto de divisão internacional do trabalho, numa lógica de racionalização da produção de mercadoria que elimina do trabalho humano toda sorte de propriedades qualitativas que poderiam ser encontradas nessa atividade. O trabalho como produção capitalista de mercadoria perde todo caráter subjetivo natural do trabalho humano.

Fragmentado em diversas fases na linha de produção capitalista, o trabalho, abstratamente racionalizado e mecanizado que é, interrompe a relação do trabalhador com o produto acabado, que neste estágio se elimina e reduz o trabalho do operário a um simples ritual de repetição mecânica de uma fase especifica do processo de produção da mercadoria, o que configura um trabalho alienado, posto que o trabalhador é cerceado de suas qualidades psicológicas em função de uma objetividade produtiva racionalizada, calculável, mensurável no tempo de trabalho socialmente necessário para a produção de uma determinada mercadoria.

O trabalho do operário é incorporado como parte mecanizada de um sistema que funciona independentemente e a cujo funcionamento ele deve se submeter, numa atitude contemplativa, de quem perde sua atividade critica, e em contrapartida se tornar um sujeito passivo diante da
engrenagem do capital ao qual esta literalmente vendido. 

Nesse contexto, segundo Lukács, se configura a redução de espaço e tempo a um mesmo denominador. O tempo ganha uma característica de homogeneidade dentro do processo de produção e o homem perde em personalidade. O tempo perde seu caráter qualitativo, mutável, fluido e da espaço a uma realidade de precisão, mensurabilidade, reificacao, trabalho mecanicamente objetivado. 

O homem se torna um ser impotente diante da dinâmica capitalista deprodução, que, aos seus olhos, se converte em num sistema que lhe é estranho
Jonh Holloway fala em reino do ser e da identidade para analisar ofenômeno da abstração do trabalho. Para ele, a separação do fazer em relação ao feito configura uma ruptura de um fluxo que priva o fazer de seu movimento natural.

Uma vez que se rompe o fazer, se nega a contradição e a identidade domina. E a identidade implica a homogeneização do tempo, quando o fluxo do fazer é interrompido e se sujeita o fazer ao feito, num processo de acumulação quantitativa, contida, alienada. O trabalho se mede quantitativamente, mensurado em horas. O fazer das pessoas seconverte em algo limitado, regido pelo interesse do capital, que as recompensa em dinheiro, tudo num ritmo preestabelecido. 

Ou seja, o tempo perde seu caráter qualitativo, mutável e fluente e se cristaliza em um continuum delimitado e mensurável. O tempo perde sua intensidade subjetiva.
O tempo se converte no tempo do relógio, tempo que se move e que permanece imóvel, rotineiro. 

O movimento também se converte em tempo do relógio, movimento de um objeto sem sujeito, movimento que se torna coisa, movimento em vez de um mover-se.
Retomando, o feito é separado do fazer que o fez. No capitalismo, a mercadoria feita pelo operário é propriedade do empregador; se tornou uma mercadoria a ser vendida no mercado, e sua existência está completamente separada de sua constituição. O feito nega o fazer. Oobjeto nega o sujeito.

O objeto constituído adquire uma identidade durável, se converte em uma estrutura autônoma do sujeito que foi seu fazedor. Deste modo, se pode concluir que a relação entre o processo de abstração do trabalho em Lukács e o reino da identidade analisado por Holloway tem em comum não apenas o escopo de apontar a alienação do trabalho do operário em relação a mercadoria e seu processo de produção, mas apontar também o caráter de usurpação do tempo criativo do homem pela lógica capitalista de produção. 

O processo da linha de produção é um processo que desumaniza e torna demasiado superficial o trabalho do homem, um processo que lhe nega uma relação plena de sentido entre seu trabalho e o produto de seu trabalho, que o faz agir mecanicamente, quando poderia ter liberdade de criatividade e subjetividade garantidas em uma tarefa na qual despende uma quantidade razoável de sua vida.

Tanto a análise de Lukacs como a análise de Holloway demonstram o primado do objeto sobre o sujeito, da mercadoria sobre o seu produtor no sistema capitalista, a alienação que esta realidade provoca, a castração da criatividade do intelecto e do engenho na atividade laboral do homem.

O trabalhador merece ter plena ciência de seu trabalho, ser senhor das coisas ao invés de ser submetido a elas. É o trabalhador que tem de se afirmar, e não o fetiche do produto de um sistema viciado de produção que reifica e aliena.


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